O Procurador-Geral da República, general Hélder Pitta Gróz, considerou hoje, em Luanda, que o sector da justiça está a viver um momento de transcendente importância, com a materialização da reforma desse ramo em curso no país. Será? Ou vamos ver cabritos defeituosos porque a mãe-cabra foi demasiado apressada na parição?
Hélder Pitta Gróz, que falava durante a tomada de posse da nova direcção do sindicato dos magistrados do Ministério Público, afirmou que a reforma é um objectivo a atingir para que o cidadão possa ter acesso à justiça facilitado.
Na ocasião, o Procurador-geral da República apelou aos empossados e magistrados a continuarem a exercer as respectivas funções com empenho e dedicação, alertando para a necessidade de se cumprir com os deveres, além de exigir a defesa dos direitos.
A parceria social, segundo Hélder Pitta Gróz, é outra componente em que o sindicato pode ter um espaço nobre para actuar, ajudando a direcção da Procuradoria-Geral da República a solucionar os diversos problemas sociais da classe.
Quanto à posição e actuação do Ministério Público, defendeu que deve ser coerente, não aceitando as tentativas passíveis de denegrir, reduzir a sua actividade ou que contrariem as leis em vigor.
Hélder Pitta Gróz disse que espera contar com apoio da direcção empossada para em conjunto identificar as fraquezas e encontrar soluções para consolidar e divulgar os bons exemplos.
Já a presidente do Sindicato Nacional dos Magistrado do Ministério Público, Maria Eugénia dos Santos, disse que a nova direcção pretende dar voz à classe, na defesa dos direitos e deveres dos filiados.
Divaguemos sobre… justiça, PGR e Companhia
João Lourenço mostrou, desde que chegou ao Poder (antes esteve quito e caladinho), que prender poderosos é algo de que o Povo gosta. De tal maneira que até nem se lembra que tem a barriga vazia, que tem falta de água potável, de energia eléctrica, de saneamento básico, de assistência médica e medicamentosa, de escolas, de alimentação, de salários compatíveis.
José Filomeno dos Santos, Jean-Claude Bastos de Morais, Valter Filipe, Augusto da Silva Tomás foram presos. Bravo. João Lourenço é o maior. Kepelipa, Matrosse, Higino Carneiro podem ser os próximos. Bravo. Isabel dos Santos também? Então aí será a farra completa e a propositura de João Lourenço para o Prémio Nobel, não importa qual.
Mesmo detidos gozam de presunção de inocência até a sentença transitar em julgado. Isso pouco importa. O orgasmo popular, como muito bem sabe João Lourenço, passa apenas e só por ver esta gente (com a qual o próprio João Lourenço esteve solidário durante décadas) no chilindró. Solidário também esteve, entre outros, Hélder Pitta Gróz.
Se acabarão absolvidos por estarem inocentes, ou por saberem coisas que poderão demonstrar que o “rei” JLo vai nu, ou acidentalmente mortos pela vergonha de estarem presos, ou fugitivos por oportuno descuido dos guardas prisionais, ou inocentados por uma filantrópica amnistia de Sua Majestade, ou por liderarem um golpe de Estado, ou… isso não importa.
João Lourenço, sobretudo nos areópagos políticos internacionais, enche o peito e diz: “Estão a ver que eu cumpro o que prometo” mas, para manter este ritmo, têm de nos perdoar parte, ou a totalidade, da nossa dívida e, é claro, mandar mais umas toneladas de fiado, mesmo que algumas fiquem a descansar num qualquer paraíso fiscal.
Declaração de bens. De quê?
Imaginemos (imaginar ainda não é crime, mas pode dar prisão – basta João Lourenço dizer) que o Estado angolano é uma entidade de bem. Assim sendo, acreditamos no Procurador-Geral da República, Hélder Pitta Gróz, quando ele afirmou, em Janeiro, que o Presidente João Lourenço tinha sido o primeiro a apresentar a sua declaração de bens.
Como então se disse, e nós aplaudimos, era uma forma de dar o exemplo aos membros do seu Executivo e, também, a outras individualidades e até mesmo aos milhões de angolanos que nem sabem o que significa ter bens.
A Declaração de Bens é (ou deveria ser) apresentada em envelope fechado e lacrado, até 30 dias após a tomada de posse ou início de funções, junto da entidade que exerce poder de direcção, de superintendência ou de tutela, que a remete, no prazo de oito dias úteis, ao Procurador-Geral da República.
Hélder Pitta Gróz explicou na altura (Janeiro, recorde-se) que a PGR estava a ter uma louvável (dizemos nós) pedagogia para mostrar a todos aqueles a quem a decisão é aplicada que nesse âmbito cabem rendimentos, títulos, acções ou qualquer outra espécie de bens e valores, localizados no país ou no estrangeiro.
A declaração de bens é obrigatória (se bem que esta questão da obrigatoriedade é muito discutível e talvez inconstitucional para alguns) para os titulares de cargos políticos providos por eleição ou nomeação, magistrados judiciais e do Ministério Público, gestores e responsáveis da administração central e local do Estado.
Em teoria (o que já não é mau), os gestores de património público afectos às Forças Armadas Angolanas e Polícia Nacional, os gestores responsáveis dos institutos públicos, dos fundos e fundações públicas e empresas públicas também estão sujeitos à apresentação da declaração. Também os deputados devem declarar o seu património.
A Declaração é (isto é como quem diz!) actualizada a cada dois anos e em caso de incumprimento prevê a punição com pena de demissão ou destituição, sem prejuízo de outras sanções previstas por lei.
Ora então, a PGR afirma que vai fazer o levantamento geral de todas as pessoas que estão sujeitas a fazer a declaração de bens, à luz da Lei da Probidade Pública, para se saber quem está em falta para – diz o vice-PGR, Mota Liz – começar a desencadear os procedimentos de responsabilização.
Portanto, e porque mais uma vez as pessoas nomeadas ou reconduzidas por João Lourenço estão algo esquecidas, Mota Liz defendeu em Março a criação de mecanismos para fiscalizar e responsabilizar as entidades sujeitas a apresentação de declaração de rendimentos e por qualquer razão não o façam.
Mota Liz garante que a PGR vai ter espaço suficiente, capacidade e recursos humanos para verificar, caso a caso, quem fez a declaração de bens e quem não fez. Isso permite concluir que todos são sérios… mas uns são, oi foram, mais sérios do que outros.
“A declaração de bens não é um fim próprio, é um meio instrumental para a garantia da probidade. Outras acções e programas para garantir a probidade, para assegurar e combater a impunidade e garantia da transparência vão continuar a ser desenvolvidas”, disse o magistrado. E disse muito bem. Veremos se daqui a alguns meses não teremos a repetição deste mesmo filme.
(E por falar em probidade. “A Lei da Probidade Pública reflecte a vontade e o esforço do Estado angolano em moralizar o exercício das funções públicas e combater a corrupção”. Isto foi dito, publicamente, em Novembro de 2011. Não, não foi José Eduardo dos Santos quem disse, nem Isabel dos Santos. Foi dito exactamente pelo então magistrado do Ministério Público, Luís de Assunção Pedro da Mota Liz, hoje vice-procurador-geral da República por escolha de João Lourenço.)
O vice-procurador-geral da República disse que – afinal – há muitas entidades (certamente por estarem ocupadas na defesa dos direitos dos nossos 20 milhões de pobres) que ainda não fizeram a declaração de bens. Benevolente, Mota Liz acredita que tal possa ter acontecido porque se calhar ignoram as consequências que podem advir do desrespeito da lei. Se calhar é isso. São todos impolutos cidadãos, não se prevendo por isso que desrespeitem a lei de forma consciente…
E as denúncias da Imprensa?
A PGR anunciou no início de Fevereiro que iria criar “nos próximos dias” (e próximos dias em Angola são o que se sabe) um corpo especial de funcionários e magistrados para se dedicar a investigações preliminares sobre denúncias feitas pela comunicação social e redes sociais.
A informação foi avançada no dia 2 de Fevereiro por Mota Liz à margem de uma cerimónia de tomada de posse de 14 sub-procuradores-gerais da República.
Mota Liz referiu que esse órgão terá como finalidade dedicar-se “concretamente à colheita deste tipo de informação, fazer um inquérito preliminar, para aferir a dignidade e a seriedade dos dados” fornecidos quer pela comunicação social quer pelas redes sociais.
“Para não estarmos a dar as notícias falsas, que são muito férteis na internet, se elas tiverem um mínimo de dignidade e seriedade, então, desencadeia-se um inquérito criminal para se apurar responsabilidades”, avançou Mota Liz, em declarações à rádio pública angolana.
Falta saber (e compreendemos que o segredo é alma também deste negócio) se – como num passado recente mas enraizado no ADN de quem nos governa há quase 43 anos – as autoridades vão mesmo criar esse órgão e analisar a “dignidade e a seriedade” das mensagens ou, apenas, identificar e punir o mensageiro.
Nesta matéria o Folha 8 está tranquilo, tarimbados desde 1995 que estamos em que as autoridades matem o mensageiro para não tomar conhecimento da mensagem. Por isso continuamos a exigir que os nossos jornalistas (por muito que isso azucrine a ERCA) não sejam nem imbecis nem criminosos. Isto porque se o jornalista não procura saber o que se passa é um imbecil. Se consegue saber o que se passa e se cala é um criminoso.
Segundo o magistrado, “muitos crimes hoje são denunciados por via da comunicação social, das redes sociais, e um órgão como a PGR não pode ficar em cima do muro, tem que andar, verificar, separar aquilo que é boato infundado e o que é notícia séria”.
“Se há notícia de crime, é óbvio que deve ser investigado, para haver seriedade, para ver até que ponto houve má-fé, dolo na prática, até que ponto factos ocorreram e até que ponto as pessoas são responsáveis”, salientou.
Os profissionais da Comunicação Social jogam um papel fundamental na moralização da sociedade relativamente à denúncia de casos de corrupção e de peculato. Isto diz, entre outros, o Folha 8, embora tenha pago um alto preço pelas denúncias feitas. Mas, com agrado, vemos agora o procurador-geral adjunto da República, Mota Liz, dizer o mesmo. Veremos se a medicação é para curar ou apenas um paliativo.
Folha 8 com Angop